Como conseguir um PhD no exterior
PhD significa Doctor of Philosophy, ou seja, é o jeito gringo de falar Doutorado. E é muito comum por aqui você já sair da graduação direto pro doutorado. Exatamente! Aqui nos Estados Unidos você não precisa de um mestrado pra fazer doutorado.
Na realidade, estou bem convencido que um brasileiro consegue fazer doutorado em qualquer lugar do mundo tendo apenas a graduação e a explicação pra isso é bem simples: Somos fodas!
Brincadeira. A verdade é que em boa parte do mundo um curso de graduação dura cerca de 3 anos. Enquanto que no Brasil as faculdades gostam de enrolar com a vida do estudante, não permitindo que ele molde seu curso de acordo com seus interesses e aspirações profissionais, obrigando que tome matérias completamente desnecessárias. Com isso, o tempo médio dos cursos no Brasil é por volta de 5 anos, sendo absolutamente comum se graduar depois de 7 anos de faculdade. Mas isto não significa que nossos cursos são ruins e nossos profissionais fracos. Muito pelo contrário. Significa que temos uma formação ampla e capaz de nos colocar frente a frente com as grandes instituições do mundo.
Quando fiz o intercâmbio na Austrália fiquei até assustando em ver como meu curso na UnB era melhor em muitos aspectos que na University of Sydney. Muitas vezes os professores das universidades públicas brasileiras são figuras de renome no mundo acadêmico internacional e nós, meros mortais estudantes, sequer sabemos ou valorizamos isto.
Vá, converse com os professores do seu departamento, encontre os pesquisadores com interesses similares aos seus, procure por pibics, mande emails e marque reuniões. Não precisa ser nada chique, apenas mencione seu interesse na área e que gostaria de sentar para conversar sobre os projetos que ele conduz. Você ficaria impressionado como um professor vai te receber bem em saber do seu interesse naquela área. Se tem algo que todos professores tem em comum é carga de trabalho alta e baixa mão de obra. Não é todo dia que alguém bate na sua porta pedindo pra trabalhar de graça!
Entender melhor as pesquisas do seu departamento te dará a oportunidade de fazer um tcc bacana, numa área que você curte. Portanto já vá mexendo seus pauzinhos por volta da segunda metade do seu curso com sorte você consegue até publicar seu trabalho. Sair da graduação com uma publicação é o academicamente equivalente a ter feito um estágio numa empresa foda.
Por falar em tcc, você sabia que no exterior geralmente não existe tcc? Pois é, este documento que defendemos no final do nosso curso costuma ser algo feito apenas no mestrado, portanto já temos outro argumento de graça porque um aluno graduado no Brasil é sim capacitado para pular o mestrado e ir direto ao doutorado no exterior.
Beleza, você fez um tcc massa, formou com boas notas, construiu uma boa relação com os professores do seu departamento, o que fazer para conseguir um doutorado?
1- Listas de email
Em primeiro lugar vá no google e comece a pesquisar por listas de emails do seu interesse imediatamente. Listas de emails pululam com ofertas de PhD e Mestrado. Eu particularmente sigo coq-club, isabelle, eapls, types@upenn, agda, que é tudo na minha área de interesse: linguagens de programação e provadores de teoremas.
Foi no coq-club que consegui o estágio em que me encontro agora e me trouxeram do brasil pra passar um mês em San Mateo fazendo treinamento e então vou trabalhar remoto até começar o PhD. Talvez continue trabalhando depois, mas tem que ver.
A verdade é que o mundo tem escassez de mão de obra qualificada e de gente altamente motivada. Você ficaria impressionado com a quantidade de oportunidades abertas nesse mundão se você se desse o trabalho de correr atrás e procurar saber sobre isso.
2- Reddit
Se você ainda não sabe usar o reddit, vá lá imediatamente e comece a futricar até aprender a usar.
Para quem não sabe, o reddit é basicamente um mega fórum com incontáveis subredits. Existe subs de basicamente qualquer coisa concebível pela cabeça humana. Lá você vai encontrar gente com interesses similares aos seus e que vão levar as discussões a sério, pois são ambientes altamente moderados. E também tem um sistema de reputação que faz as pessoas se interessarem em produzirem conteúdos de qualidade e serem úteis para a comunidade.
Não é um facebook da vida onde só tem trolls, as mensagens se perdem para todo sempre e ninguém se interessa em uma discussão séria com perguntas sérias.
Um sub particularmente interessante é o /r/gradschool. Lá você vai encontrar milhares de pessoas exatamente na mesma situação que você, e outras centenas que já passaram por tudo isso e estão lá para ajudar a tirar todas dúvidas. Na aba de descrição também tem diversos links úteis e explicações.
3- Conferências
Procure participar de conferências mesmo como ouvinte. Desta forma você fica por dentro de tudo que está acontecendo na sua área de interesse. Quais são os hot topic, quem são os grandes nomes, quais universidades estão fazendo trabalhos interessantes, etc.
Conferências também te dão a oportunidade de conversar com professores renomados da sua área em um ambiente descontraído. Você é um mero aluno de graduação, ninguém espera muito de você nessa altura, então aproveite sua condição pra fazer perguntas bobas, buscar entender como as coisas funcionam no mundo acadêmico. E isto te colocará muito a frente de outros alunos que também tem interesse mas não investiram tanto quanto você já está investindo. Lembre-se que a academia é como uma cidade pequena, isto é, todo mundo conhece todo mundo. Portanto quanto mais cedo você for visto nesta cidade melhor pra sua carreira.
Geralmente os departamentos tem uma verba do governo para participação de evento. Converse com seu orientador, veja se ele não te consegue uma ajuda de custo, nem que seja a inscrição. Demonstrar forte interesse mostrará ao seu orientador que aquele dinheiro não será um gasto, mas um investimento no seu futuro. Sei que esta crise brasileira não ajuda, portanto caso uma ajuda de custo não seja possível, tente tirar dinheiro do seu bolso para participar, você não vai se arrepender.
Meu orientador me conseguiu uma bolsa para vir fazer uma escola de verão nos EUA, foi uma oportunidade única na vida, e foi quando decidi de uma vez por todas vir fazer o PhD aqui. Até então eu também nem sabia que era possível. Mas conversando com os outros alunos, e pegando mil e uma dicas que acabei descobrindo todo esse mundo que escapa completamente da nossa realidade.
Nunca tenha medo de conversar com as pessoas, aluno ou professor. Peça dicas, procure macetes, pergunte como eles estão na situação que estão, busque assuntos interessantes para ambos e permita o diálogo fluir. Eu sei que conversar com as pessoas pode ser petrificante. Acredite em mim, já estive frente a frente com os maiores nomes da minha área. É normal sentir medo, o importante é não permitir que o medo te domine.
4- Cartas de Recomendação, Statement of Purpose, CV, GPA, TOEFL e GRE
Lembra lá atrás quando falei que você precisa de uma boa relação com os professores? Pois é, você precisa deles pra te escreverem boas cartas de recomendação. Pelo menos três. Pode soar muito, mas se você fez um bom trabalho no decorrer do seu curso vai ser relativamente fácil. Professores e Chefes querem ver profissionais competentes vencendo na vida, indo pra frente e realizando seus sonhos. Portanto garanta que você seja sempre visto como competente e dê o seu o melhor em qualquer situação que se encontre. Crie laços reais e duradouros com aqueles ao seu redor. Você não sabe quantas portas estas pessoas podem te abrir.
Algumas universidades permitem que uma das cartas de recomendação não venha do meio acadêmico. Portanto pedi uma delas pro meu antigo chefe do estágio, pois acredito que ele é uma das pessoas que foi capaz de ver meu verdadeiro potencial.
O Statement of Purpose é uma carta de duas páginas onde você vai vender seu peixe. Seu objetivo é convencer os professores do departamento a te aceitarem como aluno. Você vai falar um pouco sobre você, o que fez você decidir fazer um doutorado, qual sua experiência prática na área, porque você é apaixonado por aquilo, quais seus objetivos finais, etc. Duas páginas pode parecer pouco mas esse é um documento extremamente importante, e você tem que se esforçar pra fazer um texto perfeitamente redondo, sem informação demais e nem informação de menos. Cada palavra deve ser escolhida como uma jóia de rara beleza, e a disposição dos parágrafos pensada com cuidado. Eu particularmente gastei mais de 50 horas trabalhando na minha SoP.
É importante ter um currículo interessante. Aqui as publicações tem um peso enorme! Mas também experiência na indústria conta muito, pois isso vai mostrar que você é uma pessoa madura, experiente e com background rico. Tenha em mente que escrever seu currículo é uma arte e que não tem muitas regras nem certo e errado. Você deve se empenhar em saber quais são as qualidades que os recrutadores buscam e escrever o currículo de forma a destacá-las. Se você olhar meu currículo verá que coloquei meu tcc logo no topo para destacar minha experiência e conhecimento na área que busco seguir. Ninguém falou que você pode botar seu tcc no currículo, mas a criatividade me apontou como uma boa ideia. Seja criativo! Demonstre personalidade!!
Ao escrever o SoP e o CV tenha em mente que o doutorado é uma relação de longo prazo, geralmente com bolsa plena por parte da universidade. Portanto os recrutadores estão procurando por pessoas experientes na área, madura e altamente motivada para seguir uma carreira tão difícil quanto a acadêmica.
GPA é o grading point average, o nosso rendimento acadêmico. Suas boas notas contam. Só não sei o quanto, porque o sistema de nota brasileiro costuma ser completamente zoado e deflacionado em relação ao restante do mundo. E também é muito mais comum reprovarmos porque os professores basicamente têm autonomia demais pra fazer o que quiserem com o curso, inclusive darem asas aos seus instintos sociopatas. O que recomendo é tentar seu melhor pra tentar explicar isto no seu SOP. Se a universidade for boa de verdade vão saber ver um candidato bom mesmo sem um GPA que eles considerem ótimo.
TOEFL é a prova de proficiência em inglês. As universidades geralmente pedem uma nota superior a 100 no TOEFL ibt. O TOEFL itp (grátis e aplicado nas universidades) não costuma ser aceito. O TOEFL não é difícil, você tem que se preocupar muito mais com o GRE. Estudando pra ir bem no GRE você com certeza vai ir bem no TOEFL.
O GRE é uma prova de três frentes: raciocínio matemático, compreensão de texto nível acadêmico e escrita em nível acadêmico. Achei uma prova muito difícil e recomendo tirar pelo menos 3 meses estudando umas 20-30h por semanas. Recomendo baixar algum app pra te ajudar. No Brasil não somos acostumados a fazer prova com um tempo curto, o que dificulta ainda mais. E não deixe de treinar a escrita, foi ela que me derrubou.
5- Processo de Inscrição
Beleza, você já tem tudo que necessita pra se inscrever. Agora vem a parte pesada pro bolso: Cada inscrição custa em torno entre 60 e 80 dólares. O Toefl e o GRe custa uns $100 cada, então tenha certeza que não vai jogar esse dinheiro no lixo e se prepare para cada uma delas.
O pior é que conheci estudantes que se assustaram quando falei que só me inscrevi em três faculdades por aqui. Geralmente o pessoal se inscreve entre 5 e 10 faculdades. Mas convenhamos que gastar quase 3mil reais só para melhorar suas chances é algo um pouquinho fora de realidade pra gente né.
No entanto após aprovado no Doutorado você não precisará mais se preocupar com dinheiro. Via de regra doutorados são financiados completamente pela universidade e em troca você trabalha como Teaching Assistant (TA), equivalente a nossa monitoria. Mestrados, por outro lado, é mais comum de ser pago pela parte do estudante, sendo possível conseguir eventuais bolsas. Mas esse é o motivo principal de eu ter focado em conseguir ir pro Doutorado diretamente, seria absolutamente impossível eu pagar meus estudos e me sustentar em outro país.
Nos Estados Unidos o processo de inscrição de todas as universidade abre por volta de outubro e fecha em dezembro. Na Europa é um pouco mais bagunçado, cada professor pega o aluno quando quiser, como quiser. Então vale a pena ficar de olho nas listas de email com as mais diversas oportunidades. Outro ponto pra Europa é que você não precisa de fazer o GRE por lá.
Meu amigo Eric Schmiele pediu para avisar que a LAE dá todo o suporte e auxílio no processo de inscrição para fazer o doutorado na Austrália. Infelizmente não possuo mais informações para lhes passar sobre isso.
Estou sem ideias de como finalizar o texto, então é isso. Se depois de tudo isso você ainda tiver dúvidas, ou quiser ainda mais dicas ou só quiser conversar sinta-se livre de deixar um comentário abaixo.
PEACEOUT.